Geral da Terra, do ar, do mar e da Lua... Alma das flores, das cores, das pessoas nas ruas... Geral de tudo que se vê, de tudo que se ouve, das verdades nuas.

07/05/2007

e eu os ensinei a fazer aviõezinhos de papel...

Grêmio, BICAMPEÃO GAÚCHO!!!
Foi um grande jogo.
As peças se encaixaram.
A defesa deixou o meio seguro, que armou para o ataque.
Diego Souza tem crescido demais nas últimas partidas - e fez um golaço.
Tcheco mostrou que os péssimos jogos que fez foram mesmo uma má fase técnica, porque futebol ele tem de sobra.
Tuta não marcou, mas chamou a atenção dos defensores adversários e distribuiu a bola como um legítimo pivô.
Mas o meu destaque vai para Sandro Goiano.
Este "senhor" de 34 anos vem sendo o grande maestro das reações tricolores.
Aliás, em 2005, quando da Segundona, ele era o cara que puxava o time pra cima e orquestrava o meio-campo na busca pela vitória.
É, Sandro tem a cara do Grêmio.
Raça, pegada, vontade, sangue azul.
Já é considerado uma lenda da Geral.
Ah, a Geral...
Que torcida, que espetáculo.
Gritando, cantando e icentivando do início ao fim - de antes do início e depois do fim.
Este movimento vem mudando tudo aquilo que eu já havia visto ao vivo em arquibancada.
É uma torcida que impõe respeito pela goela.
E os jogadores sabem disso.
Assim que soou o apito final, não perderam tempo e foram para frente da massa azul-branca-preta-e-cor-de-pele que pulava dando a sensação de um mar... Um mar de felicidades!!!
E os dirigentes também sabem disso.
Essa massa NÃO é de manobra.
Chamou a atenção quando o PULHA do Odone fez a sua oportunista volta olímpica para colher os louros da vitória tricolor e deixou de passar na frente daquelas mais de 15 mil pessoas da "ferradura" da Geral.
Ele sabe que, ali, leva vaia.
E, ali, a maioria são torcedores associados.
É o prenúncio, quem sabe, de que o clube se fortifica em sua base a partir da paixão para com aquilo que realmente interessa: o Grêmio.

É, a festa estava linda.
Caminhamos pelas ruas e os gritos começavam a confundirem-se com as buzinas dos carros, dos coletivos lotados de torcedores ensandecidos.
- Grêmio! Fon-fon!!! Grêmio! Bi-bi!!! Grêmio-Grêmio-Grêmio!!!!
O destino era a Goethe - sempre a Goethe.
Lotada.
- BICAMPEÃO!!!
- São Paulo, pode esperar, a tua hora vai chegar!!!
- Bi-biiiiiiiiiiiiiiiibibibibiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!
Muitos sons, muitos sorrisos, muita vibração.
E a festa vai esmorecendo.
Ninguém é de ferro, vem mais batalha por aí.
Saio em direção à Protásio.
São as últimas buzinas, o grito de "Grêmioooooooooo" ao fundo ressoa lá dentro.
A Protásio está ali na frente.
- Tchau, negão! A gente se fala na quarta!
- Falou! Vamulá Grêmio!!!
O aperto de mão quase esmaga os dedos.
Agora, sozinho e já na Protásio, subo o caminho rememorando os gols, quem jogou bem, quem passou para quem, como vai ser na quarta...
- Hmmmm, mas o Carlos Eduardo não pode sair do time!
Me peguei falando sozinho...
Então, olho para o lado e vejo três crianças enchendo a entrada de um prédio na esquina com a Vicente da Fontoura com vários barquinhos de papel.
Crianças brancas, loiras.
É quase meia-noite.
Muito novas.
Dou três passos para trás.
- Mas onde é que vocês vão desatracar esse monte de barcos?
Os três me olham vestido de Grêmio.
- Ô, tio! O Grêmio ganhou!!!
Sentei.
- Onde está a mãe de vocês? Onde vocês moram?
Perguntas que constrangiam.
Pareciam até agredí-las.
Pâmela, 12 anos.
Camila, 8 anos.
Patric, 6 anos.
Será que estes eram os nomes e as idades deles mesmo?
Pra mim parecia...
Parei de perguntar.
- E vocês sabem fazer aviões? O exército ia ficar mais completo!
- Não sei, tio!
- Pára de me chamar de tio, Patric...
Pego algumas folhas de um desses mostruários do zaffaricarrefournacional, mátéria-prima daqueles navios que, provavelmente, se preparavam para alguma ação evasiva de guerra.
- Dobra aqui no meio, depois dobra de novo a partir da ponta, aí tu pega e faz assim e assim, ó.
- Me dá tio, deixa ver se voa!
E o Patric decolou no seu primeiro vôo.
Como sorria aquela criança que alçava vôo em um mig de celulose processada.
As meninas me olhavam atentamente.
Pâmela, a mais desconfiada, prestava atenção na didática.
- Agora, faz tu.
E ela fez!
Havíamos expandido nossa indústria!
Não faríamos mais um exército extenso, porém caduco, manco, que só atacasse pela água.
Agora, o céu era o nosso limite!
Me levantei.
- Aonde tu vai, tio?
- Tenho que ir embora...
Eles ficaram na linha de produção, enquanto o número dez em minhas costas parecia para eles cada vez menor a cada passo que eu dava...
Continuei subindo.
Quase no topo do barranco da Protásio, na churrascaria, um monte de gente.
Branca.
Loira.
Uma criança pára na minha frente.
Branca.
Loira.
Bloqueia minha passagem.
Está vestida de Grêmio dos pés à cabeça.
Será que ela sabe fazer aviõezinhos de papel?!
Driblei ela e mais alguns daqueles donos dos carrões vistosos que atracavam em frente ao restaurante.
Estes são de um outro exército.
Um exército bem mais forte que o nosso.
Segui e recebi a companhia de um outro jovem.
Branco.
Loiro.
- E aí? Tu também tava no Barranco pra ver os jogadores do Grêmio?
- Não, cara. Eu tava na Goethe...
- Pois eu estava ali e me fizeram de palhaço! Esperei um tempão e tava pegando autógrafos, já tinha conseguido 2!!! Daí veio um segurança e me deu um rapão!
Provavelmente mandado pelo PULHA do Odone...
Ou não, é essa truculência mesmo que caracteriza aquele exército dos bólidos importados.
- Caí de paleta no chão! Eu não tenho mais idade para ser palhaço de ninguém!!! Que saco...
- Quantos anos tu tem?
- 19.
- Cara, eu tenho 27. Sou formado em Jornalismo e se eu começar a pensar assim, vendo essas coisas, esses dirigentes, tudo o mais, largo o Grêmio. E eu não quero isso...
- É verdade...
Cheguei a contar para ele minha aventura pela indústria bélica que tive poucos momentos antes, mas seguimos quietos e resignados o resto do caminho.
Meu companheiro de subida entrou em sua morada, enquanto segui por mais algumas quadras até a minha.
Lá, o calor, o conforto, amor...
Ali em casa, entre uma garfada e outra de uma janta que me esperava, lembrei da Pâmela, da Camila, do Patric.
Os barulhos que vinham lá da rua já não eram mais de buzinas e de gritos.
Eram toc-toc's da chuva começando a bater forte nos telhados vizinhos.
Lembrei dos aviõezinhos.
E senti que meu mundo desmoronava, se dissolvia, assim como aqueles aviões de papel, em uma papada disforme, gosmenta.
Eu não voava mais, não conseguiríamos mais ter o céu como nosso companheiro.
E a chuva aumentava, como se fossem lágrimas grossas caindo de um céu que perdera os sorrisos do Patric.
E, agora, no meu peito, restava apenas a esperança de que com toda aquela água, nosso batalhão de encouraçados, cruzadores e fragatas de papel pudessem, enfim, seguirem seus caminhos nos rios e mares de uma cidade qualquer...
Chorei bastante.
Que nosso exército náutico cumpra a sua missão!
E eu os ensinei a fazer aviõezinhos de papel...

4 Comentários:

Blogger Aline Leão disse...

:_) Que bonito. O pior é pensar na força que teriam esses aviões se tivessem acesso a estudo, informação, amor e saúde. Beijo.

07/05/2007, 19:39

 
Blogger Rica Retamal disse...

Nossa triste realidade...
Muito bonito este texto Guga!

08/05/2007, 10:52

 
Anonymous Anônimo disse...

Lindo, rapaz. Obrigada por me fazer chorar mostrando a realidade de forma poética. Sejamos felizes mas não alienados e submissos.

Abraço.

Bjo pra Têmis!!! =)

08/05/2007, 14:34

 
Anonymous Anônimo disse...

Guga e Têmis!
Queria dizer que é muito bom fazer a leitura diariamente do "Alma da Geral", sempre tem textos atualizados e muito interessantes.

Vcs são demais!!!

08/05/2007, 22:03

 

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